quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O limiar entre a realidade e a conspiração


Século XX: o mundo foi testemunha da disputa de dois regimes políticos pelo poder. Mais do que a vitória de um país sobre o outro, a Guerra Fria simbolizou a supremacia do capitalismo. A partir daí, esse sistema político, social e econômico alastrou-se pelo mundo como uma epidemia. Hoje, até mesmo a China (politicamente socialista e economicamente capitalista) encontra dificuldades em conter o "american way of life" entre seus numerosos cidadãos. O império do capital se firmou, definitivamente.

Quais as repercussões disso ? Um sistema baseado no dinheiro trás consigo algumas características: supervalorização do capital, o que significa busca do máximo lucro possível, mesmo que às custas do injusto empobrecimento alheio, ao sempre pagar menos do que o trabalhador deveria realmente receber. Karl Marx viria a chamar tal fenômeno de mais-valia. Buscar o lucro acima de tudo significa acima inclusive dos próprios seres humanos: surge a cultura do individualismo, a Sociologia chama o fenômeno de "coisificação das pessoas", ou seja: não só perdemos importância, mas também nós mesmos nos tornamos mercadorias.

Dos sociólogos clássicos, há discordância quanto à responsabilidade pelo regime político-econômico que vivemos hoje: Marx afirma ser toda a organização social ser baseada na economia, enquanto Weber fala em igual importância econômica, moral e ideológica para a formação do fenômeno existente hoje. De qualquer forma, a realidade é: instaurou-se um sistema tão bem desenvolvido que seu personagem central deixou de ser um simples instrumento de troca para ser elevado à categoria de deus: o deus dinheiro.

Atualmente, a frase que mais se pronuncia no mundo é o mantra "preciso de dinheiro! Preciso de mais dinheiro!". Do ponto de vista da sociedade, buscar o dinheiro é o normal, portanto é o padrão estipulado. Mas e caso haja alguém imune ao mantra capitalista ? Provavelmente, por ser exceção à regra tal pessoa será ao menos discriminada, podendo até mesmo ser excluída da sociedade. Ser excluído não significa ser fisicamente expulso, mas ser socialmente desintegralizado, psicologicamente afetado. O quadro aqui descrito, segundo Durkheim é por ele denominado suicídio social.

Ok, se não se pode vencê-los, junte-se (ao menos em parte) a eles. Caso você consiga adaptar-se somente exteriormente, mas psicologicamente a discordância continue, ao menos você tem seu lugar no grupo, entretanto a frustração reprimida uma hora poderá se manifestar. O que o ser humano comum então faz? Isso mesmo! Descarrega na arte.

E de todas as artes atuais, uma das mais populares anda sendo constante válvula de escape. O cinema está repleto de filmes acerca do regime do capital: Gattaca, Laranja Mecânica, THX 1138, Matrix. Alguns fizeram mais sucesso que outros, alguns são mais fáceis de entender que outros, mas todos tem o mesmo denominador comum: a crítica contundente ao deus dinheiro e seu império da coisificação das pessoas. E o que faz com que filmes tão ácidos façam tanto sucesso? Simples, o fato de nos identificarmos com eles.

Por mais que vários longametragens produzidos sejam ambientalizados num mundo muito mais tecnológico e/ ou futurista que o nosso, o que se percebe em todos eles é a luta do ser humano angustiado por sua prisão social. É contraditório observar que as regras de conduta que nós mesmos criamos possam nos frustrar tanto, mas é o que ocorre. A primeira vítima da sociedade onde tudo é comercializável é ela própria. E é aí que entra a arte: pura e simples catarse, pois da mesma forma que o personagem se liberta dos mecanismos de coerção social no filme, nós por alguns instantes nos sentimos igualmente livres.

E o que tudo isso tem a ver com o assunto do blog ? Tradicionalmente, tem-se a visão de cobaias como ratinhos de laboratório, ou (para pessoas mais conscientes da realidade) de pessoas em vulnerabilidade social sendo exploradas por grandes conglomerados farmacêuticos. Mas será essa a única forma de se usar cobaias humanas em massa? O que quero dizer é: até onde temos liberdade de ser e de estar em nossa sociedade? Até que ponto a ditadura do lucro a todo custo não nos reduziu a tal ponto de grande parte da humanidade não ter se tornado a cobaia da busca desenfreada por mais e mais lucro? Qual é o ponto em que termina a realidade e começa a ficção?

“Se você pegar a pílula azul, a história acaba. Você vai acordar na sua cama e vai acreditar no que você quiser acreditar. Se você pegar a pílula vermelha, você fica no País das Maravilhas e eu vou te mostrar quão funda a toca do coelho vai.
Eu estou te oferecendo somente a verdade, nada mais."

Influências:

1) O Capital, Karl Marx e Friedrich Angels.
2) Economia e Sociedade, Max Weber.
3) O Suicídio, Émile Durkheim
4) THX 1138, George Lucas (1967).
5) The Matrix, Irmãos Wachowski (1999).

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